DISSENSOS

É comum dizer-se que não se deve definir uma ideia negativamente…

Dissensos NÃO é um exercício de discordância; é uma atenção voltada para perturbações na suposta estabilidade entre acordos e desacordos, na camada sedimentada onde circulam os que dizem sim e os que dizem não.

Dissensos NÃO é a busca da última palavra ou da última novidade. NÃO retorna, mas também NÃO avança indiscriminadamente para adorar o deus absoluto do novo.

Dissensos mora lá, onde há produção de sensibilidades capaz de descontinuar as cadeias das sensibilidades normais, nas quais se estabelecem os acordos tácitos que sustentam as maneiras ditas corretas de ver, fazer, ouvir, dizer. Porque acordos não são construídos apenas em palavras e ações, mas também através dos modos com os quais poderes se instauram silenciosamente no corpo, na linguagem, nos meios e maneiras de sentir e pensar, individuais ou coletivos.

À política dos acordos e desacordos se opõe a produção do dissenso como maneira de pensar e agir conforme a uma antecipação, dentro do mundo, de outro mundo possível. Pensar esteticamente a política para avaliar politicamente as sensibilidades.

Produzir um dissenso NÃO é apenas buscar um tema novo ou uma abordagem nova para os velhos temas, mas um modo de ficcionalizar a própria realidade, encontrando novos caminhos para a construção dos espaços, dos tempos das imagens e do mundo, das memórias, dos saberes.

Se há uma conexão entre as artes e os dissensos, é porque a arte reorganiza o sensível de modo a serem trazidos à luz os acordos como tais. Sendo as obras das artes máquinas de dissenso, falar delas deve fazer jus aos dissensos que produzem. Continuar, ao falar delas, o movimento dissensual que iniciam.

Dissensos NÃO se ancora em formas específicas de apresentação: podem ser fragmentos ou figuras acabadas em vídeo, em texto, em áudio…

Dissensos NÃO vale pelos formatos e dispositivos técnicos que utiliza, mas pelo gesto de expressão e perturbação a que cada um dá acesso.

Se nos colocarmos entre a luz dividida do mundo e o olho que vê, o que encontramos é o prisma que abre as potências do olho para ver e da luz para se dividir em suas cores.

Dissensos SÃO os trabalhos do coco que pensa com pelos, dureza e doçura.

Como trabalho acadêmico, Dissensos surgiu de um módulo de ensino e pesquisa no PETFACOM da UFJF, no qual foi feita uma leitura conjunta de alguns textos de Jacques Rancière sobre as relações entre estética e política, mobilizando exemplos buscados por nós todos para dar conta de pensar não apenas aqueles textos, mas seu potencial para abrir perspectivas para ver melhor os filmes, séries e vídeos que víamos, músicas que ouvíamos ou leituras que fazíamos. Encontrar nossos próprios exemplos se tornou um método de leitura, mais do que a mera busca de ilustrações para os conceitos.

Por Nilson Alvarenga

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